Senado quer tirar Conselho de Ética de paralisia após nova crise com Marcos do Val

A cúpula do Senado quer a retomada do Conselho de Ética da Casa depois de as ações do STF (Supremo Tribunal Federal) contra Marcos do Val (Podemos-ES) aumentarem atritos entre Legislativo e Judiciário. 

O próprio presidente da Casa, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), deu sinais nesse sentido.
As comissões temáticas da Casa Alta tiveram integrantes indicados e presidentes escolhidos no início do ano. Não foi o caso do Conselho de Ética, que entrou em uma espécie de ostracismo.

O colegiado é responsável por analisar punições a senadores que tenham conduta considerada inadequada. Mesmo quando está em condições de funcionar, porém, o órgão tem atuação discreta.

A avaliação de senadores ouvidos pela Folha é que o estresse entre a Casa e o STF poderia ter sido evitado se os próprios senadores tivessem imposto algum tipo de reprimenda a Do Val no passado.

O senador foi alvo de medidas cautelares depois de viajar aos Estados Unidos contrariando determinação do ministro do STF Alexandre de Moraes. Na volta a Brasília, passou a ser monitorado por tornozeleira eletrônica, recebeu uma ordem judicial para ficar recolhido em casa à noite e perdeu o passaporte diplomático. Além disso, a verba de seu gabinete foi congelada.

O Senado precisaria votar se aceita ou não as medidas contra Do Val. A cúpula da Casa tenta evitar essa votação porque há a avaliação de que seria grande a probabilidade de a maioria dos senadores decidir enfrentar o Supremo, derrubar essas determinações judiciais e escalar uma crise entre Poderes.

Marcos do Val disse que avisou as autoridades que encontraria sua filha nos Estados Unidos e que informou detalhes da viagem. “Se não fosse para sair do Brasil, teria muito claro escrito ‘proibido de deixar o país’ ou alguma outra coisa nesse sentido [na decisão de Moraes]”, afirmou o senador. Ele diz que está sendo perseguido pelo ministro do STF mesmo sem ter sido denunciado pelo Ministério Público.

As ações contra Marcos do Val foram um dos motivos mencionados pelos bolsonaristas que se amotinaram no Senado na última semana para tomar o plenário da Casa, em movimento deflagrado por causa da prisão domiciliar do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Alcolumbre teve duas reuniões para discutir a rebelião e, em uma delas, deu sinais de que o Conselho de Ética poderá voltar.

De acordo com o líder do PSB na Casa, Cid Gomes (CE), Alcolumbre cobrou que as bancadas partidárias indiquem seus representantes para o Conselho de Ética –passo indispensável para instalar o colegiado. “Conselho de Ética é uma instância que deve existir. Não é normal que não esteja instalado”, declarou o senador do PSB.

“Cada senador é responsável por seu mandato. Nos casos analisados por falta de decoro, alguma denúncia do Poder Judiciário, do Ministério Público, algum desvio, quem pode julgar também é o Conselho de Ética, não só o Judiciário”, disse o presidente da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, Otto Alencar (PSD-BA), sobre a situação de Marcos do Val.

A forma encontrada pela cúpula do Senado para contornar o impasse com o STF, em conversas com integrantes do tribunal, foi pedir que a corte retire as medidas cautelares que interfiram no exercício do mandato de Marcos do Val e, paralelamente, suspender o mandato do senador por meio da Mesa Diretora, órgão que dirige a Casa. Assim, a medida punitiva seria aplicada pelo próprio Senado, sem a interferência de um Poder externo.

O problema é que não há um precedente, e a suspensão provavelmente será decidida com base em uma prática da Câmara, e não do Senado.

Reservadamente, líderes da bancada avaliam que essa manobra só será viável porque o prejudicado é Marcos do Val. O senador tem poucos aliados dispostos a brigar por ele. Além disso, ele não teria condições de obter decisão favorável à manutenção de seu mandato no STF por seu histórico de problemas com a corte.

Alcolumbre, porém, resiste à possibilidade de cassação do mandato de Marcos do Val, que acaba em 2027. Parte dos senadores tenta convencê-lo a pedir licença médica, hipótese que é rechaçada por Do Val.

“Eles estão falando seis meses [de suspensão]. Entraria suplente [Rosana Foerst]. Eu nem conheço minha suplente. Querem me tirar para que as pessoas esqueçam o Marcos do Val”, afirmou o congressista.

O senador pelo Espírito Santo tem processos em andamento no Conselho de Ética. O órgão abriu procedimentos contra ele por ter divulgado documentos da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) e por um suposto plano de gravar conversas privadas de Alexandre de Moraes. Ambos os episódios causaram desgaste político ao Senado.

Os casos foram abertos em julho de 2024, e não houve nenhuma reunião do colegiado depois disso. O Conselho de Ética teve apenas cinco encontros formais de 2018 para cá, de acordo com a agenda pública do Senado.

O último presidente do colegiado foi o senador Jayme Campos (União Brasil-MT). Ainda não há um acordo entre as bancadas sobre quem será o próximo a comandar o Conselho de Ética. A equipe de Davi Alcolumbre informou que o presidente do Senado não comentaria o caso.

Caio Spechoto, Folhapress

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