Aliados ampliam pressão para Ciro Gomes desistir de candidatura após ação da PF

Foto: Eduardo Knapp/Folhapress/
Membros do PDT preferem priorizar eleição de deputados e falam até em federação com o PT
A operação da Polícia Federal que teve como um dos alvos Ciro Gomes levou pedetistas a irem às tribunas e às redes sociais em defesa de seu pré-candidato à Presidência, mas, nos bastidores, elevou a já considerável movimentação contrária à postulação do ex-ministro ao Palácio do Planalto.
A ação policial chegou em um mau momento da campanha, já que Ciro aparece em pesquisas de intenção de votos ou atrás ou em empate técnico com o ex-juiz Sergio Moro (Podemos), além de haver um clima hostil entre o candidato e parte da bancada federal na Câmara.

Em um indicativo simbólico, Ciro não compareceu à festa de confraternização de fim de ano da bancada de deputados federais, realizada em Brasília na noite desta terça-feira (14), na casa do deputado Mario Heringer (MG).
Boa parte da bancada prefere que o PDT não tenha candidato à Presidência e privilegie, na distribuição das verbas de campanha do partido, os candidatos à Câmara dos Deputados.

Há até um prazo estipulado informalmente para que a candidatura de Ciro decole para acima de 15% nas pesquisas de intenção de voto: março. Caso contrário, poderá haver uma debandada significativa. Pela pesquisa do Ipec divulgada nesta terça, o pedetista tem 5%.
Tradicionalmente não é usual haver grande oscilação de intenção de voto de candidatos já colocados nesse período da pré-campanha, o que, indicam parlamentares, significa que o prazo dado a Ciro internamente é, na verdade, um pretexto para a debandada já definida.

Pedetistas ouvidos pela Folha defendem, inclusive, que o partido integre a tentativa de formação de uma grande federação entre partidos de esquerda liderada pelo PT de Luiz Inácio Lula da Silva. A informação é confirmada por integrantes do PT.
As federações são uma novidade na legislação e têm o objetivo de aumentar as chances dos partidos que se unem de eleger bancadas mais fortes para a Câmara dos Deputados e Assembleias Legislativas.

Pelo atual sistema eleitoral, as cadeiras no Legislativo são distribuídas de acordo com o total de votos recebidos pelos partidos. A união em federação aumenta esse bolo de votos. Diferentemente da coligação, que está proibida, a federação exige que os partidos que a compõem atuem de forma unitária durante os quatro anos da legislatura.
O PDT da Câmara avalia que se ficar isolado por causa da candidatura de Ciro, vai ter um desempenho pífio na eleição de deputados. Hoje o partido tem 25 cadeiras. Integrantes da legenda que defendem o ingresso na federação das esquerdas argumentam, ainda, que a participação do PDT é fundamental para que o peso das siglas menores, unidas, faça frente ao do PT e evite uma hegemonia do partido de Lula na aliança.

Além do interesse eleitoral dos parlamentares —vários consideram suas chances mais expressivas sem Ciro na disputa—, na avaliação de alguns deles é fatal o peso de uma operação da PF em uma candidatura presidencial, ainda mais levando em conta o universo sem lei das redes sociais.
Por esse raciocínio, mesmo que haja uma saída por cima de Ciro em relação à investigação, o uso por adversários de material fora de contexto tem peso relevante na disputa.

O mau clima entre Ciro e a bancada federal tornou-se explícito após o pedetista se chocar publicamente com os parlamentares na votação da PEC dos Precatórios, no início de novembro.
Ele ameaçou nas redes sociais retirar o seu nome da disputa caso os deputados da sigla mantivessem o apoio majoritário à medida, prioridade do governo Jair Bolsonaro (PL) para vitaminar o Auxílio Brasil e tentar recuperar sua popularidade.

Nos bastidores, deputados do PDT afirmaram que Ciro sabia e havia concordado com a posição da bancada. A maior parte voltou atrás por pressão da cúpula do PDT e, no segundo turno da PEC, votou contra a medida.
Apesar do clima de desânimo com a candidatura do ex-ministro, tanto integrantes do PDT como de outros partidos de esquerda afirmaram considerar ter havido viés político na ação da PF, muito em razão do lapso de tempo entre o suposto delito, os anos de 2010 e 2013, e a operação de busca e apreensão.

Alguns congressistas de partidos de esquerda apontaram como indicativo nesse sentido, inclusive, a informação, publicada pelo Painel, da Folha, de que internamente delegados da PF afirmam que se trata de um inquérito aberto com base em acordos de colaboração fechados pela PGR (Procuradoria-Geral da República) ainda como “herança” da Lava Jato, no sentido de exageros nas medidas.
Alguns parlamentares chegaram a levantar, sem apresentar qualquer elemento concreto nesse sentido, a hipótese de que esse suposto viés político tenha um objetivo mais regional do que nacional.

Segundo essa tese, a operação visou beneficiar politicamente a pré-candidatura ao governo do bolsonarista Capitão Wagner (Pros-CE), adversário dos Gomes no Ceará.
A PF deflagrou a operação na manhã desta quarta-feira (15), apontando indícios de desvios nas obras do estádio Castelão, no Ceará. Houve cumprimento de 14 mandados de busca e apreensão determinados pela Justiça, tendo entre os alvos os irmãos Ciro e Cid Gomes, senador, também do PDT.

Segundo nota da polícia, as suspeitas são de “fraudes, exigências e pagamentos de propinas a agentes políticos e servidores públicos decorrentes de procedimento de licitação para obras” no estádio, entre os anos de 2010 e 2013. O inquérito teve início em 2017 e contou com relatos de quatro delatores.
Pelas redes sociais, Ciro sugeriu que a ação da PF foi política. “Não tenho mais dúvida de que Bolsonaro transformou o Brasil num Estado Policial que se oculta sob falsa capa de legalidade”, escreveu.

O atual pré-candidato do PDT já disputou a Presidência da República em três ocasiões, 1998, 2002 e 2018. Ele ficou em terceiro em duas delas (1998 e 2018) e em quarto na outra (2002). Seu melhor desempenho ocorreu na última disputa, em que obteve 12,5% dos votos válidos.
Ranier Bragon / Folha de São Paulo

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