Parlamento de Portugal rejeita Orçamento e pode derrubar governo socialista

Foto: Armando Franca/AP Photo/Estadão

O Parlamento de Portugal rejeitou nesta quarta-feira, 27, o Orçamento apresentado pelo governo do premiê socialista António Costa para 2022, uma recusa que abre as portas para a realização de eleições antecipadas nos próximos meses.

Com minoria no Parlamento, o governo viu seus ex-aliados da esquerda radical, os Comunistas e o Bloco de Esquerda, alinharem-se aos conservadores para derrubar o projeto, por 117 a 108, além de 5 abstenções.

O fracasso anunciado do projeto põe em xeque o gabinete de Costa e abre o caminho para a dissolução do Parlamento e a convocação de eleições, alertou o presidente de Portugal, o conservador Marcelo Rebelo de Sousa, com a esperança de forçar um compromisso entre o Executivo minoritário e os partidos que o apoiam desde o final de 2015.

Na segunda, Sousa afirmou que sem um Orçamento, que depende fortemente dos fundos de recuperação da pandemia da União Europeia, ele não teria alternativa a não ser dissolver o parlamento e convocar eleições antecipadas dois anos antes do previsto. “Minha posição é muito simples: Orçamento ou dissolução”, declarou.

O Orçamento apresentado por Costa previa cortes no imposto de renda para a classe média, aumento do investimento público para estimular a recuperação pós-pandemia e reduzia o déficit de 4,3% do Produto Interno Bruto, em 2021, para 3,2%.

Apesar disso, os ex-aliados de extrema esquerda de Costa exigiam mais benefícios e proteções para os trabalhadores, melhorias no sistema de seguridade social e mais investimento público no serviço de saúde, o que afirmam que Costa ignorou por estar muito focado em cortes de déficit. O premiê justificou afirmando que não poderia prejudicar a credibilidade internacional duramente conquistada em um país com um dos maiores encargos de dívida pública da Europa e que foi sujeito a dolorosa austeridade em 2011-14 sob um resgate internacional.

Diante do Parlamento nesta quarta, Costa afirmou que não estava pedindo um “cheque em branco” com o Orçamento, e disse estar com a consciência tranquila por ter feito “tudo ao seu alcance” para construir o plano. “Fiz tudo o que estava ao meu alcance para assegurar a viabilidade desta proposta, sem aceitar o que em consciência não considero que o país poderia suportar”, disse. E completou: “o governo fez a sua parte”.

Segundo o líder da oposição de direita no Parlamento português, Rui Rio, com a rejeição do Orçamento, novas eleições devem ser convocadas em janeiro.

Costa, que presidiu o país durante seis anos de relativa estabilidade, marcada por um sólido crescimento econômico e um pequeno superávit orçamentário antes da pandemia do ano passado, descartou a renúncia e disse que lideraria seu partido em qualquer campanha eleitoral.

Frágil união da esquerda

Os socialistas chegaram ao poder há seis anos graças a uma aliança inédita com os dois partidos que votaram contra o Orçamento – que os apoiaram durante seu primeiro mandato sem entrar no governo.

Naquele momento, a esquerda havia superado suas divisões para acabar com a política de austeridade aplicada pela direita em troca do plano de resgate internacional concedido a Portugal em 2011.

Mas as discussões sobre o orçamento de 2022 colidem principalmente com a vontade da esquerda radical de revogar as disposições do código do trabalho herdadas da época da “troika” dos credores (União Europeia/ Banco Central Europeu. FMI).

Esta frágil união da esquerda, conhecida pelos portugueses como “Gerigonça”, começou a rachar após as eleições de 2019.

Costa, que foi o mais votado, mas não alcançou a maioria por oito cadeiras, se absteve então de negociar novos acordos que garantiriam a estabilidade até as legislativas previstas para o final de 2023, preferindo negociar pontualmente os apoios parlamentares necessários.

Um ano atrás, o orçamento de 2021 foi aprovado por pouco, graças à abstenção da coalizão comunista-verde e de um pequeno partido animalista.

Neste ano, a estagnação orçamentária se materializou quando o Partido Comunista, seguindo o exemplo do Bloco de Esquerda, anunciou na segunda-feira sua intenção de votar contra o projeto do governo, exigindo maiores esforços a favor do poder de compra e dos serviços públicos.
Estadão Conteúdo

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