'Fraco', 'furos inaceitáveis', traição à ciência': especialistas e organizações criticam rascunhos de textos da COP30

O texto frustrou organizações e ativistas por não incluir políticas para redução do uso combustíveis fósseis.
A divulgação dos rascunhos da COP30 nesta sexta-feira (21) gerou repercussão entre organizações, especialistas e governos que defendiam textos mais ambiciosos.

Desde o início da cúpula, o governo vinha articulando a criação de um “mutirão global” que incluísse o mapa do caminho — um roteiro para reduzir a dependência dos combustíveis fósseis. O tema, porém, nunca entrou oficialmente na agenda da conferência, diante da resistência de alguns blocos de países.
Os rascunhos, ou drafts, são versões intermediárias dos textos, produzidas à medida que as discussões avançam.

Ainda na noite de quinta-feira (20), mais de 30 países já haviam se pronunciado pressionando a Presidência da COP30 ao afirmar que não apoiariam um texto final da Cúpula que deixe de fora um mapa do caminho de transição global para longe dos combustíveis fósseis.

No documento, países como Colômbia, França, Reino Unido, Alemanha e outros afirmam que “não podem apoiar um resultado que não inclua um mapa do caminho justo, ordenado e equitativo para deixar os combustíveis fósseis para trás”.

Veja abaixo o que disseram organizações e especialistas sobre o texto

Observatório do clima

O Observatório do Clima chamou o “Pacote de Belém”, como são chamados os rascunhos, de "desequilibrado e com furos inaceitáveis", criticando a ausência de um roteiro para abandonar os combustíveis fósseis.

Apesar de reconhecer avanços como o triplo financiamento para adaptação e a criação de um mecanismo de transição justa, a entidade afirma que as causas da crise climática foram ignoradas e alerta que a COP30 não será bem-sucedida se os desequilíbrios persistirem no documento.

Greenpeace

A diretora executiva do Greenpeace Brasil, Carolina Pasquali, afirmou que as metas de emissão para 2035 estão muito aquém do esperado e que o texto da Decisão Mutirão é praticamente inútil, pois contribui muito pouco para reduzir a lacuna de ambição de 1,5°C e para pressionar os países a acelerarem suas ações.

"Não há outra opção senão os países rejeitá-lo e devolvê-lo à presidência para revisão", disse.

Apesar de reconhecer um pequeno avanço com o Mecanismo de Transição Justa, o Greenpeace avalia que o financiamento climático segue frágil, com promessas insuficientes e sem mecanismos concretos para apoiar os países mais vulneráveis.

Irene Vélez Torres, ministra do Meio Ambiente da Colômbia

"Tivemos uma grande decepção ao conhecer o texto, já que ele exclui dois temas muito relevantes para o sul global: o roteiro de eliminação progressiva de combustíveis fósseis e um mecanismo de transparência do financiamento para os países do Sul".

Tratado sobre Combustíveis Fósseis

A Iniciativa do Tratado sobre Combustíveis Fósseis também criticou o texto. Segundo o movimento, as medidas propostas pelo rascunho são insuficientes considerando o impacto que as mudanças climáticas já exercem sobre milhões de pessoas em todo o mundo.

"A falta de um plano concreto para lidar com a produção de carvão, petróleo e gás só aumenta a urgência de um Tratado sobre Combustíveis Fósseis", disse o presidente do movimento, Kumi Naidoo.

Instituto Talanoa

Para Caio Victor Vieira, especialista em Políticas Climáticas do Talanoa, apesar de “balanceado”, o texto teve perdas importantes de linguagem e ambição, principalmente relacionado aos combustíveis fósseis.

"Infelizmente não possui mais ali uma linguagem sobre o abandono dos combustíveis fósseis, mas sim diversas considerações sobre como é importante impulsionar e implementar mais rápido projetos de economia de energia limpa renovável de maneira justa e equitativa", diz.

Já a presidente da organização, Natalie Unterstell, chamou o rascunho de "fraco e vago". Ela afirma que o texto do Mutirão cria “salas de espera” para temas centrais como transição, financiamento e adaptação.

"Não há linguagem sobre combustíveis fósseis, não há uma direta relação com o parágrafo 28. Então é um rascunho fraco, é um rascunho nesse momento que faz, digamos, ambição por subtração", afirma.

Pavilhão de Ciência Planetária

O grupo de cientistas, incluindo Carlos Nobre, Thelma Krug e Johan Rockström, criticou a ausência de menção aos combustíveis fósseis no novo texto e afirmou que se trata de “uma traição à ciência e às pessoas mais vulneráveis”.

“É impossível limitar o aquecimento a níveis que protejam as pessoas e a vida sem eliminar gradualmente os combustíveis fósseis e acabar com o desmatamento. Nessas últimas horas, os negociadores devem trabalhar juntos para recolocar no texto os roteiros para um futuro mais seguro e próspero. A ciência está aqui para ajudar”, diz a nota.
O pesquisador do clima, Carlos Nobre, disse à Globonews que está torcendo para que essa versão seja apenas preliminar e que os textos oficiais incluam a importância de zerar os combustíveis fósseis: "É inaceitável", afirmou.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Comente esta matéria.