Cid se diz frustrado com linha investigativa da PF após declarações prestadas em delação
Ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL), o tenente-coronel Mauro Cid disse nesta segunda-feira (9), em depoimento no STF (Supremo Tribunal Federal), ter se sentido frustrado diante das interpretações da Polícia Federal sobre as declarações que ele dava para a colaboração premiada.
Segundo Cid, ele tinha um entendimento diferente dos investigadores sobre os fatos que narrava na delação que deu base à denúncia sobre a trama golpista de 2022. “Eles tinham uma linha investigativa e eu tinha outra visão dos fatos. E houve uma frustração do que eu estava contando não estar na linha investigatória da PF”, disse.
O tenente-coronel respondia às primeiras perguntas do relator do caso, ministro Alexandre de Moraes, no primeiro interrogatório da ação penal. Neste momento, o magistrado questionou a respeito de áudios divulgados pela revista Veja com relatos de pressão para as declarações. Em resposta, Cid afirmou que passava por um momento pessoal complicado.
“Foram vazamentos sem consentimento, de um desabafo de um momento difícil que eu e minha família estávamos passando. Eu vendo minha carreira militar desabando, minha vida financeira acabada e me gerou uma crise pessoal muito grande, o que leva a desabafo com amigos, nada de maneira acusatória, mas crítico. Digamos assim, saindo atirando para todo lado, por um momento ruim que a família estava passando”, afirmou.
Mauro Cid confirmou os principais detalhes da trama golpista já apontados pelo militar durante a colaboração premiada. Ele disse que Bolsonaro recebeu no fim de 2022 uma minuta de decreto que previa a prisão de autoridades, como ministros do STF e integrantes do Legislativo, e a criação de uma comissão para organizar novas eleições presidenciais.
Segundo o militar, Bolsonaro alterou o decreto algumas vezes. “Ele enxugou o documento, retirando as autoridades das prisões. Só o senhor ficaria preso”, disse Cid ao ministro Alexandre de Moraes.
“Os outros receberam um habeas corpus”, brincou Moraes. O próprio ex-presidente Bolsonaro riu da piada do ministro, sentado em cadeira no centro do tribunal.
O tenente-coronel também confirmou que recebeu do próprio ex-ministro Braga Netto, general da reserva do Exército, uma caixa de vinho cheia de dinheiro vivo para entregar ao tenente-coronel Rafael de Oliveira —militar acusado de liderar um grupo que planejou matar Moraes.
Cid diz que, na época, entendia que o plano de Oliveira era levar familiares para Brasília, com o objetivo de mobilizar o acampamento em frente ao QG do Exército. A investigação da Polícia Federal, porém, concluiu que o plano do militar era prender e assassinar o ministro do Supremo.
Mauro Cid conta que o amigo pediu dinheiro a ele e enviou uma planilha no WhatsApp com o orçamento. O ex-ajudante de ordens de Bolsonaro pediu ajuda a Braga Netto. Dias depois, o general o entregou o dinheiro.
“Retornei ao Braga Netto, e o general Braga Netto trouxe uma quantidade de dinheiro. Com certeza não foram os R$ 100 mil. [O dinheiro] foi passado para o major de Oliveira. Eu recebi do general Braga Netto no Palácio da Alvorada. Estava numa caixa de vinho”, disse.
O início da fase de depoimento dos réus da tentativa de golpe de 2022 promoveu o primeiro encontro após dois anos de investigação entre o ex-presidente Jair Bolsonaro e Mauro Cid —seu auxiliar mais próximo em quatro anos de governo que se tornou seu delator.
O tenente-coronel Mauro Cid mudou de versão sobre a trama golpista de Jair Bolsonaro e aliados ao longo de seus 12 depoimentos à Polícia Federal no âmbito do acordo de colaboração premiada.
Foi só em seu último depoimento, diante de Alexandre de Moraes, que Cid contou que o ex-ministro Walter Braga Netto entregou dinheiro em uma sacola de vinho para um militar acusado de planejar o assassinato do ministro do Supremo.
A Polícia Federal chegou a alegar que Mauro Cid havia mentido em seu vaivém à sede da corporação e sugeriu ao STF o rompimento do acordo de colaboração. Moraes convocou o militar para prestar esclarecimentos e, diante de novas revelações, decidiu manter a validade da delação.
Os advogados de quatro réus disseram à Folha, sob reserva, que estavam empenhados em procurar novas contradições de Mauro Cid durante o depoimento ao STF nesta segunda-feira. O objetivo é reunir informações para pedir novamente o fim do acordo de delação.
Ministros do Supremo, porém, alegam que a eventual declaração de invalidade da colaboração premiada do tenente-coronel não anula os depoimentos ou as provas colhidas por meio da delação. O único efeito, dizem, é sobre os benefícios de Mauro Cid.
A controvérsia sobre a validade do acordo de Mauro Cid com a Polícia Federal foi levantada pelo ministro Luiz Fux durante o julgamento do recebimento da denúncia contra o núcleo central da trama golpista.
“Este não é o momento próprio, mas vejo com muita reserva nove delações de um mesmo colaborador, cada hora apresentando uma novidade”, disse Fux. Cármen Lúcia e Cristiano Zanin concordaram que a discussão deveria ser feita após o recebimento da denúncia.
A Primeira Turma do STF iniciou nesta segunda a fase de depoimento dos réus do núcleo central da trama golpista de 2022. O primeiro a responder às perguntas é o tenente-coronel Mauro Cid, por ser colaborador da investigação.
Os demais réus vão ser questionados seguindo ordem alfabética: Alexandre Ramagem (deputado federal e ex-chefe da Abin), Almir Garnier (ex-chefe da Marinha), Anderson Torres (ex-ministro da Justiça), Augusto Heleno (ex-ministro do GSI), Jair Bolsonaro, Paulo Sérgio Nogueira (ex-ministro da Defesa) e Walter Braga Netto (ex-ministro da Casa Civil e da Defesa).
O tribunal reservou sessões diárias até sexta-feira (13) para ouvir os réus. Os depoimentos são transmitidos ao vivo pela TV Justiça.
Mauro Cid teve o acordo de colaboração premiada homologado em setembro de 2023 pelo ministro Alexandre de Moraes. Em troca de falar tudo que sabia sobre a trama golpista no fim do governo Bolsonaro, o militar solicitou benefícios, como o perdão judicial ou pena privativa de liberdade inferior a dois anos e a extensão de benefícios à sua família.
Cézar Feitoza e Ana Pompeu, Folhapress
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