Ex-ministro se diz inocente e que sua vida mudou em dia de áudio BRASIL

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil/Arquivo
O ministro da Educação, Milton Ribeiro, escreveu uma carta com pedido de exoneração do cargo nesta segunda-feira (28). Ribeiro se tornou alvo de grande pressão após a revelação de indícios de um esquema informal de obtenção de verbas envolvendo a intermediação de dois pastores sem cargo público.

A exoneração foi publicada em edição extra do Diário Oficial na tarde desta segunda-feira (28).

Logo no início da carta, Milton Ribeiro escreve que “desde o dia 21 de março minha vida sofreu uma grande transformação”. Foi neste dia que foi revelado o áudio em que o próprio ministro diz priorizar amigos do pastor Gilmar Santos a pedido de Bolsonaro e sugere ainda haver uma contrapartidada supostamente direcionada à construção de igrejas.

Prefeitos apontaram nos últimos dias a existência de uma espécie de balcão de negócios no MEC, operado pelos pastores Gilmar e Arilton Moura, ligados a Bolsonaro. “Meu afastamento visa, mais do que tudo, deixar claro que quero uma investigação completa e isenta”, diz o texto.

“Agradeço e despeço-me de todos que me apoiaram nesta empreitada, deixando o compromisso de estar pronto, caso o Presidente entenda necessário, para apoiá-lo em sua vitoriosa caminhada”, diz a carta divulgada pelo ministro.

Em uma primeira versão da missiva, compartilhada por membros do governo e parlamentares, Ribeiro afirmava que voltaria ao governo depois de demonstrar sua inocência. Isso foi retirado na versão final.

Pela manhã, Ribeiro passou horas em reunião fechada com o secretário-executivo da pasta, Victor Godoy Veiga, cotado para assumir seu lugar.

Milton Ribeiro reafirma na carta que ele próprio levou ao conhecimento da CGU (Controladoria-Geral da União), em agosto passado, denúncia sobre a atuação dos pastores Arilton Moura e Gilmar Santos.

O agora ex-ministro escreve ainda na carta que a competência para liberações é do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), que é ligado ao MEC e controlado pelo centrão.

“Cumpre ressaltar que os procedimentos operacionais relacionados à liberação de recursos pelo FNDE não são de competência direta do Ministro da Educação”, diz o texto.

A situação do ministro se agravou na segunda-feira da semana passada, após a revelação do áudio em que Milton Ribeiro afirma que o governo prioriza prefeituras cujos pedidos de liberação de verba foram negociados pelos pastores Gilmar e Arilton.

Na gravação, o ministro diz ainda que isso atende a uma solicitação de Bolsonaro e menciona pedidos de apoio que seriam supostamente direcionados para construção de igrejas. A influência dos pastores junto ao MEC foi revelada anteriormente pelo jornal O Estado de S. Paulo.

“Foi um pedido especial que o presidente da República fez para mim sobre a questão do [pastor] Gilmar”, diz o ministro na conversa em que participaram prefeitos e os dois religiosos.

Em seguida, o prefeito Gilberto Braga (PSDB), do município maranhense de Luis Domingues, afirmou que um dos pastores que negociam transferências de recursos federais para prefeituras pediu 1 kg de ouro para conseguir liberar verbas de obras de educação para a cidade.

Já na sexta-feira, em entrevista à Folha, o prefeito de Piracicaba (SP), Luciano Almeida (União Brasil), disse que recebeu um pedido de dinheiro para que o município abrigasse um evento com a presença do ministro Milton Ribeiro em agosto de 2021.

O gestor municipal afirma que se recusou a fazer o pagamento e que o encontro acabou não se concretizando. Dois servidores do alto escalão do MEC diseram que os pastores com supostos privilégios dentro da pasta estariam à frente dessa negociação.

Os pastores Gilmar e Arilton têm, ao menos desde janeiro de 2021, negociado com prefeituras a liberação de recursos federais para obras de creches, escolas, quadras ou para compra de equipamentos de tecnologia.

Os dois pastores têm proximidade com Bolsonaro desde o primeiro ano do governo. A atuação dos pastores junto ao MEC foi revelada anteriormente pelo jornal O Estado de S. Paulo.

Confira a íntegra da carta:
Dirijo-me a todos os estudantes, profissionais da educação, servidores e demais cidadãos brasileiros.
Desde o dia 21 de março minha vida sofreu uma grande transformação. A partir de notícias veiculadas na mídia, foram levantadas suspeitas acerca da prática de atos irregulares em nome do Ministério da Educação.

Tenho plena convicção que jamais pratiquei ato de gestão que não fosse pautado pela legalidade, pela probidade e pelo compromisso com o Erário. As suspeitas de que foram cometidos atos irregulares devem ser investigadas com profundidade.

Mais recentemente, solicitei também àquela Controladoria que auditasse as liberações de recursos de obras do FNDE, para que não haja dúvida sobre a lisura dos processos conduzidos. Cumpre ressaltar que os procedimentos operacionais relacionados à liberação de recursos pelo FNDE não são de competência direta do Ministro da Educação.

São quatro os pilares que me guiam: Deus, família, honra e meu país. Além disso, tenho todo respeito e gratidão ao Presidente Bolsonaro, que me deu a oportunidade de ser Ministro da Educação do Brasil num momento transformador para a educação brasileira. Registro que, sob a condução do Presidente da República, tive a oportunidade de conviver com uma equipe de ministro altamente qualificados e comprometidos com a ética e a probidade públicas.

Assim sendo, levando em consideração os aspectos citados, decidi solicitar ao Presidente Bolsonaro a exoneração do cargo de Ministro, a fim de que não paire nenhuma incerteza sobre a minha conduta e a do Governo Federal. Meu afastamento visa, mais do que tudo, deixar claro que quero uma investigação completa e isenta.

Tomo esta iniciativa com o coração partido. Prezo pela verdade e sei que a verdade requer tempo para ser alcançada. Sei de minha responsabilidade política, que muito se difere da jurídica. Minha decisão decorre exclusivamente de meu senso de responsabilidade política e patriotismo, maior que quaisquer sentimentos pessoais.

Agradeço e despeço-me de todos que me apoiaram nesta empreitada, deixando o compromisso de estar pronto, caso o Presidente entenda necessário, para apoiá-lo em sua vitoriosa caminhada. Brasil acima de tudo!!! Deus acima de todos!!!

Brasília/DF, 28 de março de 2022
Milton Ribeiro

Ricardo Della Colletta/Paulo Saldaña/Folhapress

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