Membros do conselho deixam cargos na Petrobras após troca no comando da estatal

Foto: Marcos Correia/PR/Silva e Luna

Quatro dos 11 membros do conselho de administração da Petrobras informaram a companhia que não aceitarão a recondução ao cargo na próxima assembleia geral extraordinária da estatal.

A decisão vem após o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) decidir trocar Roberto Castello Branco pelo general Joaquim Silva e Luna no comando da petroleira por críticas à política de preços da empresa. A troca foi interpretada pelo mercado como interferência do governo na estatal.

Bolsonaro tem o direito de indicar o presidente da Petrobras porque a União é a maior acionista da companhia. A nomeação, porém, depende de aval do conselho. O mandato de Castello Branco se encerra em 20 de março.

A recondução deles havia sido proposta pela União, conforme ofício do Ministério de Minas e Energia recebido pela companhia em 19 de fevereiro. Além desses quatro, a Petrobras tem outros três conselheiros indicados pelo governo federal.

“Em virtude dos recentes acontecimentos relacionados as alterações na alta administração da Petrobras, e os posicionamentos externados pelo representante maior do acionista controlador da mesma, não me sinto na posição de aceitar a recondução de meu nome como conselheiro desta renomada empresa, na qual tive o privilégio de servir nos últimos sete meses”, afirmou o conselheiro Omar Carneiro da Cunha, segundo comunicado da Petrobras desta terça-feira (2).

Ele elogiou a direção atual, que segundo ele seguiu “os mais altos níveis de governança e de conformidade com os estatutos da empresa, e aos mais altos padrões de gestão empresarial”.

“A mudança proposta pelo acionista majoritário [a União], embora amparado nos preceitos societários, não se coaduna com as melhores práticas de gestão, nas quais procuro guiar minha trajetória empresarial. Sendo assim, acredito que minha contribuição ao Conselho de Administração e à empresa seria fortemente afetada, e minha efetividade reduzida”, disse.

Também anunciaram a saída João Cox Neto, Nivio Zivian e Paulo Cesar de Souza.

Souza e Silva também elogiou a atual direção. “Aproveito para registrar meu respeito e reconhecimento pelo excelente trabalho desenvolvido pela diretoria executiva e funcionários da Petrobras bem como pelos meus colegas conselheiros sob a liderança do presidente [do conselho] Eduardo Leal.”.

Ainda segundo o comunicado da Petrobras, Cox Neto e Ziviani informaram que não poderão aceitar a recondução por razões pessoais.​

O governo deverá indicar os substitutos, que deverão ser submetidos ao processo de análise de gestão e integridade da companhia, além de análise pelo comitê de pessoas da estatal.
‘EFEITO RUIM’
O ministro Paulo Guedes (Economia) afirmou nesta terça-feira (2) que a ação de Bolsonaro na Petrobras gerou efeito econômico ruim. Para ele, no entanto, é preciso respeitar a decisão do presidente, que tem a palavra final.

“É compreensível politicamente a atitude. Do ponto de vista econômico o efeito foi ruim, essa foi a nossa conversa interna”, disse o ministro, em entrevista à rádio Jovem Pan.

“A minha visão sobre estatais é conhecida. Agora, eu tenho que respeitar o presidente da República, ele diz ‘é isso aqui que eu quero agora’, ele tem o direito”, afirmou.

Para o ministro, o domínio da Petrobras cria um problema político sério. Isso porque, como o setor está nas mãos da estatal, o governo acaba levando a culpa sempre que há elevação de preços dos combustíveis.

“O ônus e o bônus estão caindo na própria presidência. Já que a estatal continua estatal, o povo vai sempre cobrar do governo uma atitude em relação ao preço de um produto que você tem a presença do Estado na exploração, no refino e na distribuição, mesmo que ela repita práticas internacionais”, disse.

A mudança na Petrobras fez as ações da petroleira caírem, e a CVM (Comissão de Valores Mobiliários) detectou movimentação atípica em operações na Bolsa de Valores sugestivas de que investidores detinham informação privilegiada de mudança no comando da estatal antes de ter sido anunciada por Bolsonaro.

A área técnica da CVM, junto com a B3, faz uma análise prévia para avaliar a necessidade de instauração de processo. Apesar das chances de abertura de investigação, a Folha apurou que ainda não há decisão nesse sentido.

ENTENDA O CONSELHO DA PETROBRAS
Como o conselho é formado?
O conselho de administração da Petrobras é formado por no mínimo 7 e, no máximo, 11 membros. Atualmente, são 11. Os integrantes têm mandatos de até dois anos e podem ter até três reeleições consecutivas. Todos os membros do conselho, incluindo o presidente, são eleitos em assembleia geral dos acionistas. A União, que é acionista majoritária, tem a prerrogativa de indicar a maioria dos membros.

Quem preside o conselho?
O conselho atual é presidido por Eduardo Bacellar Leal Ferreira, almirante de esquadra da reserva e ex-comandante da Marinha do Brasil. Indicado pelo governo, o militar teve sua nomeação aprovada pelo conselho de administração da Petrobras em janeiro de 2019. Em junho do mesmo ano, o governo propôs a recondução do militar ao cargo. De acordo com o estatuto da Petrobras, os cargos de presidente do conselho de administração e presidente da companhia não podem ser exercidos pela mesma pessoa.

O que o presidente do conselho faz?
Em reuniões do colegiado, cabe ao presidente do conselho convocar os conselheiros para se manifestarem sobre os temas abordados, controlar a extensão e relevância das intervenções, organizar votações e declarar resultados. Em caso de ausência ou impedimento para conduzir a reunião, o presidente poderá indicar um substituto, o qual não terá o voto de qualidade, responsável pelo desempate.

Como o conselho funciona?
O Conselho de Administração da Petrobras se reúne, no mínimo, uma vez por mês. O grupo também pode fazer reuniões extraordinárias. Os encontros são realizados quando há convocação do presidente do conselho ou da maioria dos integrantes. A convocação para a reunião é feita por escrito, com antecedência mínima de sete dias. Há exceção para casos de “manifesta urgência” definidos exclusivamente pelo presidente do conselho. O conselho pode convidar ocasionalmente executivos da empresa e pessoas externas à Petrobras com o objetivo de colaborar com as discussões.

Quais são as regras de deliberação?
Os membros do conselho têm o direito de pedir vista aos temas deliberados. Cabe ao presidente do conselho examinar o pedido e submetê-lo à decisão dos conselheiros. Neste caso, a deliberação pertinente à matéria em questão será suspensa até a reunião seguinte, quando o voto do conselheiro deverá ser emitido. O prazo de vista poderá ser prorrogado a pedido do presidente do grupo ou de um conselheiro interessado. De acordo com o regimento, as operações que envolvem a União deverão ser aprovadas por maioria qualificada, ou seja, pelo voto de ⅔ dos conselheiros presentes. Em caso de empate, o presidente do Conselho terá poder de decisão.

QUEM SÃO OS MEMBROS ATUAIS?
Sete integrantes do conselho da companhia foram indicados pela União, que é a acionista controladora. Os demais foram eleitos pelos demais acionistas.

Roberto Castello Branco
Indicado pelo governo, o economista é presidente da Petrobras e membro do conselho de administração desde janeiro de 2019. Foi consultor para a área energética da equipe de transição do governo Jair Bolsonaro (sem partido) e teve seu nome confirmado na presidência da estatal pelo ministro Paulo Guedes (Economia) em novembro de 2018, antes da posse presidencial.
Na FGV (Fundação Getulio Vargas), foi professor afiliado e diretor do Centro de Estudos em Crescimento e Desenvolvimento Econômico. Dirigiu empresas como Vale e a Amcham (Câmara Americana de Comércio para o Brasil). Atuou em conselhos de administração da Invepar, GRU Airport e outras companhias. De maio de 2015 a abril de 2016, integrou o comitê de auditoria da Petrobras.

João Cox Neto
Indicado pelo governo, o economista foi presidente da Claro e da Telemig Celular. É presidente do conselho de administração da Vivara, vice-presidente do conselho da Braskem e membro dos conselhos da Petrobras, Embraer, Linx e Qualicorp.

Omar Carneiro da Cunha Sobrinho
Indicado pela União em 2020, o economista foi presidente-executivo de empresas como Shell Brasil, Billiton Metais, AT&T Brasil e Varig. Além da Petrobras, é membro do conselho de administração do Grupo Energisa, Brookfield Properties Partners LP, Libraport Campinas, e sócio da empresa Dealmaker Consultoria e Participações. Integrou o conselho de administração e a diretoria de empresas e entidades, como o Sindicom (Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis e de Lubrificantes ) e a Associação Comercial do Rio de Janeiro.

Nivio Ziviani
Indicado pelo governo, é engenheiro mecânico, pesquisador de tecnologia da informação e empresário. Membro da Academia Brasileira de Ciências, pesquisa algoritmos, recuperação de informação e inteligência artificial. Fundou empresas de tecnologia.

Ruy Flaks Schneider
Indicado pelo governo, Schneider é oficial da reserva da Marinha e presidente do conselho de administração da Liga da Reserva Naval do Brasil. Engenheiro industrial mecânico e de produção, fundou o departamento de engenharia industrial da PUC-Rio (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro), onde foi diretor.

Paulo Cesar de Souza e Silva
Indicado pela União, foi presidente-executivo da Embraer. Formado em ciências econômicas pela Universidade Mackenzie, é membro independente dos conselhos de administração da Cemig (Companhia Energética de Minas Gerais) e do Grupo Águia Branca, que atua nas áreas de transporte e logística. Em 2016, recebeu do Ministério da Defesa a Ordem do Mérito Aeronáutico e, em 2018, foi condecorado com a Ordem Nacional Barão de Mauá.

Rosangela Buzanelli Torres
Eleita pelos empregados da companhia em 2020, Torres ingressou na Petrobras em 1987 no cargo de geofísica e atualmente trabalha na área de operação exploratória marítima águas profundas. É mestre em geociências pelo Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).

Marcelo Mesquita de Siqueira Filho
Eleito por acionistas minoritários detentores de ações ordinárias desde 2016, o economista é sócio-fundador da Leblon Equities, gestora de recursos focada em ações brasileiras e co-gestor de fundos de ações e private equity. Trabalhou na área de mercado de capitais do banco UBS Pactual e foi analista de empresas de commodities no Banco Garantia. Marcelo é, ainda, membro do conselho de administração da Tamboro Educacional e do Fundo Patrimonial (Endowment) da PUC-Rio.

Rodrigo de Mesquita Pereira
Eleito por acionistas detentores de ações preferenciais, é advogado, sócio do escritório Alves Ferreira & Mesquita Sociedade de Advogados, e atuou como promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo, de 1991 a 2001. Foi membro suplente do conselho fiscal da Petrobras de 2018 a 2019, integrante do Grupo Especial de Recursos Hídricos do Ministério Público do Estado de São Paulo, e conselheiro fiscal na Cemig (Companhia Energética de Minas Gerais).

Leonardo Pietro Antonelli
​Eleito por acionistas minoritários, é advogado, sócio-fundador do escritório Antonelli Advogados, professor universitário e atuou como conselheiro da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil). Foi desembargador no Tribunal Regional Eleitoral do Estado do Rio de Janeiro.

Eduardo Bacellar Leal Ferreira
Almirante de esquadra da reserva e ex-comandante da Marinha do Brasil. Indicado pelo governo, é o presidente do conselho

Folhapress

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